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A Lei da Empresa Limpa (Lei 12.846/2013) e a falácia do “você precisa implementar um Programa de Compliance para cumprir a lei”

Author: Guest Author

Hammer

Este post foi escrito por Alexandre Serpa, profissional de compliance baseado em Sao Paulo, Brasil.

Mal havia sido promulgada a Lei 12.846/2013 e se via o aumento de chamadas do tipo “Empresas começam a implementar programas de Compliance para cumprir a nova lei …”

Havia uma quantidade relevante de artigos em jornais, blogs, revistas e outros meios de comunicação que tratavam do assunto da nova lei e que, se não indicavam a implementação de um programa de compliance como ‘obrigatório’, ao menos deixavam implícito ao leitor que essa era um pré-requisito para o cumprimento da Lei. E eu, pessoalmente, creio que essa profusão não é justificada nesse momento.

Antes de me aprofundar no tema título deste texto, deixe-me fazer uma regressão e discutir o seguinte cenário:

É apresentada a você uma tarefa: pregar um prego a uma placa de madeira.

A grande maioria de nós, senão todos nós, imediatamente pensará que ‘temos que’ arranjar um martelo, pois o martelo é imprescindível para a tarefa de pregar o prego na placa de madeira.

A essa maioria de nós o martelo se torna mais importante que a tarefa em si. Mas esquecemos que o martelo é apenas uma ferramenta que ‘pode’ auxiliar na execução da tarefa. É perfeitamente possível pregar um prego a uma placa de madeira ‘sem’ utilizar um martelo. Pois no caso de não termos um martelo a mão, podemos utilizar uma outra placa de madeira, a sola do nosso sapato, uma pedra, um alicate, as próprias mãos (improvável eu sei, mas possível) para realizar a tarefa.

Por outro lado, se teimarmos em utilizar o martelo, teremos uma outra série de desafios e variáveis e situações para levar em conta. A primeira questão é sobre qual o tipo/ tamanho do martelo (há muitas variações de martelos disponíveis) é o correto ou o mais adequado para a tarefa. Também precisamos levar em consideração a capacitação que temos para utilizar o martelo – eu mesmo conheço muita gente que antes de conseguir pregar o prego na madeira iria ou criar diversas marcas na madeira, ou entortar o prego, ou acertar – e machucar – o próprio dedo (ou o dedo de um terceiro).

Voltando para nosso tema central eu quero apenas fazer equivaler o “Programa de Compliance” ao “martelo” de nossa analogia anterior.

A Lei 12.846 é bastante clara em dizer que o que não podemos (devemos!) fazer, enquanto empresas, é “subornar oficial público”, “utilizar laranjas” ou “fraudar licitações públicas”, e essas são as ‘tarefas’ em questão.

Em nenhum momento a lei diz que ‘temos que’ implementar programas de compliance, mas se limita a dizer que os mesmos serão utilizados (considerados!) como atenuantes em casos na aplicação de sanções. Ou, em outras palavras, que os programas de compliance somente entram na discussão em momento em que a empresa já foi pega descumprindo a lei.

O que quero dizer é que, muito embora os programas de compliance sejam ótimas ferramentas (quando implementados como parte de uma governança corporativa adequada que se inicia com o tom no topo, e passa por escolher e selecionar bons profissionais) os mesmos são parte natural de um progresso e não são a solução mágica (como um martelo) para todos os problemas. No limite, para cumprir a lei basta que a empresa não suborne, não fraude e não utilize laranjas.

Para resumir: Utilizar ferramentas tem como objetivo tentar facilitar a execução da tarefa. Mas a utilização das ferramentas não é nem obrigatória, e tampouco é garantia de que a tarefa será executada corretamente, pois a ferramenta em si poderá se tornar um problema maior que a tarefa original. Também é importante manter em perspectiva que a ferramenta não pode se tornar mais importante que a tarefa original. Também há a questão de qual é o momento correto de se utilizar as ferramentas.

Não quero dizer que os programas de compliance são desnecessários ou que não devam ser implementados – até porque tenho interesses pessoais em que sejam. Quero apenas que se mantenha a ordem e relavância de cada componente da governança corporativa sejam calmamente avaliados e implementados.

Para pensar.

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Categories: Brasil, Compliance Anticorrupção, FCPA, Português

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