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A nova Lei de Lavagem de Capitais dois anos depois

AMLBrazil2 [1]O post de convidados abaixo foi escrito por Davi Tangerino e Filipe Batich. Eles são, respectivamente, sócio e associado do Grupo de Direito Penal Empresarial do Trench, Rossi e Watanabe Advogados [2] em São Paulo, Brasil.

A legislação brasileira anti-lavagem de dinheiro (AML em inglês) foi modificada em julho de 2012, incorporando significativas mudanças à lei (veja o post sobre tais mudanças aqui). O presente post ressalta alguns dos principais avanços na área de AML desde então, a fim de conferir se, conforme popularmente dito no Brasil, “a nova lei colou”(no sentido de ter sido completamente imposta e observada).

Segundo estatísticas do COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras, houve uma redução de 19% nos números de ocorrências de transações suspeitas entre 2012 e 2013 – 1,587,427 em 2012 e 1,286,233 em 2013 – muito embora as alterações de 2012 tenham ampliado a lista de indivíduos e pessoas jurídicas obrigadas a reportar as mencionadas transações (os chamados guardiões).

Em 2013, o setor financeiro teve o maior número de ocorrências (75%), seguido pelas loterias e sorteios (12%), seguros e pensões (9%) e transações envolvendo imóveis (2%). O número de ocorrências reportadas pelos novos guardiões – tais como aqueles que vendem bens de luxo, promovem ou intermediam transações envolvendo atletas profissionais, tabeliães e associações comerciais etc. – foi insignificante.

Quais poderiam ser as causas de tais resultados?

Esta resposta talvez esteja relacionada a problemas frequentes no Brasil: (i) o Estado não é capaz de fornecer a estrutura para as obrigações trazidas pela nova lei imediatamente ou em um tempo razoável; e (ii) leva-se muito tempo para editar regulamentos para viabilizar a aplicação da nova lei. Por exemplo, o COAF ainda não expediu normas regulatórias para aqueles que negociam gado ou bens agrícolas de alto valor, nem para quem transaciona atletas profissionais, dois importantes setores da economia brasileira.

O COAF vem revogando uma série de normas anteriores à alteração de 2012, porém, ainda não as substituiu. Tal demora pode estar ligada ao desenvolvimento da análise de risco de cada setor delimitado pelas normas da AML, conforme recomendado pela Grupo de Ação Financeira Internacional – GAFI. Contudo, para agilizar o processo, o COAF deve aumentar o número de profissionais responsáveis por tal desenvolvimento. Ele deve também abrir novas unidades, nas maiores capitais brasileiras, a fim de facilitar o contato e a comunicação com as instituições financeiras e as profissões e atividades não-financeiras designadas. Essas mudanças auxiliam na inspeção e na fiscalização do cumprimento da lei.

Ademais, com a alteração legislativa de 2012, algumas normas mais antigas do COAF devem ser substituídas por normas de agências profissionais ou reguladoras aplicáveis aos novos guardiões. Mas muitas agências têm resistido a atualizar suas normas atuais, especialmente de modo a adequá-las às 40 recomendações do GAFI; a estabelecer controle sobre Pessoas Expostas Politicamente (PEP); e a obrigar seus membros (e.g., Ordem dos Advogados do Brasil– OAB) em relação aos deveres de AML.

Uma significativa parte das pessoas obrigadas a reportar atividades suspeitas não está ciente de suas novas obrigações, especialmente as empresas que não executam atividades designadas e outras profissões, por exemplo, por aqueles que vendem bens de luxo ou alto valor ou que prestam serviços de consultoria. Á título exemplificativo, a nova norma exige que as pessoas envolvidas na indústria de bens de luxo ou alto valor implementem uma política denominada Conheça Seu Cliente (KYC em inglês) e registrem qualquer transação acima de 10 mil reais. Contudo, ainda é difícil encontrar aqueles que cumprem integralmente tais obrigações neste setor.

Dessa forma, tudo leva a crer que a melhoria e a aplicação das novas regras na luta contra a lavagem de dinheiro e contra o financiamento ao terrorismo no Brasil dependerá de: (i) expansão da estrutura do COAF; (ii) uma atualização mais rápida das normas regulatórias relacionadas às obrigações da AML, seguindo as recomendações do GAFI e a Lei; e especialmente, (iii) implementação de controles e políticas da AML pelos novos profissionais e companhias compelidas a reportar atividades suspeitas. Neste sentido, os setores público e privado precisarão abraçar a lei anti-lavagem para que ela finalmente cole.

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