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Restituição para Vítimas de Suborno: Obstáculos dos EUA vs. tendências internacionais

FCPARestitution2 [1]A versão original desse blog post foi escrita em Inglês. A tradução foi realizada por Merrill Brink International [2].

Tom Waits cantou, “a grande medida dá, e a pequena medida tira”. O mesmo pode ser dito para a noção de restituição para as vítimas da FCPA. Como discutido em um post anterior [3], a lei dos EUA parece obrigar os tribunais a ordenar a restituição para as vítimas da FCPA – pelo menos em alguns casos -, mas a restituição geralmente não abrange as vítimas da FCPA. Este post fornece a medida pequena que impede tal restituição, e identifica um movimento internacional para a restituição para as vítimas de propina.

Limites na Ordem de Restituição

Os tribunais têm a autoridade para ordenar a restituição por crimes em virtude da Lei de Proteção às Vítimas e Testemunhas (VWPA) e a Lei de Restituição Compulsiva a Vítimas (MVRA). A VWPA, originalmente aprovada em 1982, deu aos tribunais o critério para ordenar a restituição criminal. A MVRA, aprovada em 1996, tornou obrigatório para os tribunais ordenar tal restituição.

Há limites para essa obrigação, no entanto, alguns dos quais são relevantes para as vítimas da FCPA. Um deles é que tanto a VWPA como a MVRA abrangem a restituição para crimes de Título 18, mas a FCPA está codificada nos termos do Título 15 do Código dos EUA. Como resultado, a MVRA não exige diretamente a restituição para violações da FCPA. Mas a restituição em matéria da FCPA ainda é possível, uma vez que as acusações para as violações da FCPA são rotineiramente acompanhadas por acusações de violação de Título 18, como conspiração, lavagem de dinheiro e fraude eletrônica.

Outra limitação é uma “exceção de complexidade” que libera o tribunal de sua obrigação de ordenar a restituição, quando o processo de determinar a perda da vítima seria muito complicado ou prolongaria indevidamente o processo de sentença. Essa exceção foi invocada pelo tribunal no caso de Alcatel, (veja abaixo), mas, em geral, parece improvável que determinar a restituição para um governo estrangeiro seria mais complicado do que o fazer para uma empresa ou uma ONG.

Limites para a Obtenção do Estatuto de Vítima

Embora os tribunais têm a obrigação de ordenar a restituição, as vítimas também têm o direito à restituição. A Lei dos Direitos de Vítimas de Crime [4] concedeu às vítimas de crime certos direitos em casos criminais, incluindo o direito à “restituição integral e oportuna”, como previsto em lei. Mas esses direitos também estão sujeitos a limitações que limitam a restituição para as vítimas da FCPA.

A CVRA exige que o DOJ faça “melhores esforços para que as vítimas de crime sejam informadas” de seus direitos como vítimas. Se o DOJ não identificar e informar a vítima da FCPA ou de um crime relacionado, a vítima pode requerer ao tribunal de julgamento o estatuto e os direitos de proteção da vítima. Mas as vítimas estrangeiras de violações da FCPA não são suscetíveis de ter consciência do seu direito à restituição. E, sem aviso atempado do DOJ, a vítima vai saber sobre uma violação da FCPA – se souber de todo – apenas quando o acordo for anunciado. Nesse momento, a vítima teria de requerer ao tribunal para rejeitar um acordo já acordado.

Mas outra razão para os tribunais não exigirem a restituição às vítimas estrangeiras parece ser a preocupação [5] com o tratamento de um governo “corrupto” como uma vítima. Essa preocupação ficou evidente no caso da Alcatel [6], uma ação de aplicação em que três subsidiárias da multinacional francesa se declaram culpadas de conspirar para violar a FCPA, pagando milhões em propinas a autoridades da ICE, uma empresa de propriedade do governo da Costa Rica. Após o acordo da Alcatel com as autoridades norte-americanas, a ICE pediu [7] ao tribunal por uma restituição, argumentando que era uma vítima e tinha sofrido perdas nas mãos de seus diretores e trabalhadores corruptos. O tribunal de primeira instância e, posteriormente, o da 11ª Região, considerou que a ICE foi um coconspirador na corrupção e não tinha direito a restituição, observando que, em geral, “um participante de um crime não pode recuperar a restituição”.

Essa preocupação não se deve aplicar em todos os casos – alguns têm sugerido [8] que a ICE estava se debatendo com um conjunto particularmente ruim de fatos. E a conclusão do Tribunal de se tratar de um coconspirador sugere que uma outra entidade do governo da Costa Rica – uma não envolvida pela corrupção em questão – poderia ter tido mais sucesso em proteger os direitos das vítimas.

Tendências Internacionais Opostas

Diante desses obstáculos, a restituição por ordem judicial para as vítimas da FCPA é uma perspetiva improvável. Mas pode ser o momento para o DOJ considerar uma outra abordagem – há sinais de um movimento internacional para a indemnização das vítimas de suborno.

A Iniciativa de Recuperação de Ativos Roubados publicou recentemente um estudo e um banco de dados [9] sobre acordos em casos de suborno estrangeiro e as implicações para a recuperação de ativos.

E, em 25 de outubro de 2013, uma coalizão de ONGs anticorrupção, incluindo a Transparency International, a Global Witness e a Christian Aid, exortaram [10] os Estados a cumprir suas obrigações nos termos do Artigo 53 da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (UNCAC). Esta disposição obriga os Estados-membros a:

[tomar as medidas] para permitir que seus tribunais ordenem aqueles que tenham cometido [crimes de corrupção] a pagar uma indemnização ou danos a outro Estado-membro que tenha sido prejudicado por esses delitos.

Alguns países já tomaram medidas para esse fim – a lei britânica prevê a restituição às vítimas sob a Lei de Suborno do Reino Unido.

Tudo isso levanta a questão de saber se os EUA poderiam remover os obstáculos à restituição nos casos da FCPA, permitindo a compensação mais freqüente para as vítimas estrangeiras de propinas estrangeiras? Ou é uma má ideia assegurar a restituição aos governos estrangeiros, cujas entidades participaram de um esquema de corrupção? Como disse [11] Mike Koehler, no Professor da FCPA:

Eu não estou certo de para onde as multas devem ir quando uma empresa francesa suborna “entidades estrangeiras” da Costa Rica, mas eu tenho quase certeza que a resposta não deve ser de 100 % para o Tesouro dos EUA.

Nota: a versão deste post apareceu pela primeira vez em Sin Miedos [12] , um blog do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

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