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A Copa do Mundo e as Olimpíadas: Destacando Riscos de Corrupção no Setor da Construção do Brasil

Author: Matteson Ellis

WorldCupConstruction

A versão original desse blog post foi escrita em Inglês. A tradução foi realizada por Merrill Brink International.

Há dois anos, a FCPAméricas realçou as perspectivas locais sobre os riscos de corrupção decorrentes da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016, ambos organizados pelo Brasil. Agora, com o primeiro jogo da Copa do Mundo sendo realizado hoje, começam a chegar denúncias de casos específicos de abuso. Muitas dessas denúncias referem-se à construção de novas instalações.

Por exemplo, o novo estádio de Brasília, financiado pelos contribuintes, é envolvido em uma névoa de desconfiança e indicadores de possível corrupção. Uma recente auditoria governamental, discutida aqui, determinou que os custos projetados para o estádio triplicaram, chegando a quase 1 bilhão USD. Isso faz do estádio de Brasília o segundo mais caro do mundo – isso, em uma cidade que nem sequer tem um grande time de futebol profissional. A auditoria identificou 500 milhões USD em gastos questionáveis ​​no estádio, como o transporte de arquibancadas pré-fabricadas que foi orçado em 4.700 USD e acabou custando 1,5 milhão USD, ou 2,3 milhões USD em gastos com materiais que estão listados várias vezes em faturas.

Ao mesmo tempo, um estudo da Associated Press informa que o construtor principal do estádio aumentou suas doações políticas na eleição mais recente em quase 500 vezes, o que sugere um acordo de contrapartidas com as entidades adjudicantes dos contratos.

Ainda mais surpreendente é a resposta das entidades governamentais a estas acusações. O chefe do comitê governamental para a Copa do Mundo em Brasília, que é responsável pela supervisão do projeto, questionou o momento da divulgação da auditoria governamental dizendo que “eles estão tentando estragar a festa”.

Esses casos destacam os riscos de corrupção na construção de grandes projetos de obras públicas, como estádios. A seguir, encontram-se alguns fatores específicos que contribuem para esses riscos no Brasil:

  1. Licenciamento freqüente: A construção exige licenciamento e inspecções governamentais, que exigem interação com autoridades governamentais. Nesta área, os requisitos regulamentares do Brasil podem ser onerosos. No Relatório Doing Business de 2014 do Banco Mundial, o Brasil ficou em 130º de entre 189 economias com relação à “facilidade de obtenção de licenças de construção”, com 15 procedimentos que requerem 400 dias. Em comparação com outros países latino-americanos como a Colômbia (24º no ranking, com 8 procedimentos levando 54 dias), o Equador (64º no ranking, com 16 procedimentos levando 115 dias), e o México (40º no ranking, com 11 procedimentos levando 82 dias), as regras de construção do Brasil são surpreendentemente onerosas. Devido a isso, é comum as empresas contratarem despachantes para ajudar a agilizar processos, criando o risco de pagamentos indevidos de terceiros. Além disso, quanto mais complicados os regulamentos, mais numerosas são as autoridades governamentais envolvidas e mais poder discricionário tem cada uma. Isso significa mais espaço para a corrupção.
  2. Conluio/concertação em licitações: No setor da construção, é comum os projetos dispendiosos serem financiados pelo governo. No Brasil, isso muitas vezes dá origem a esquemas de conluio sofisticados envolvendo múltiplos atores para manipular as adjudicações de contratos. Por exemplo, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) do Brasil, seu regulador anti-trust, está atualmente investigando várias empresas, incluindo a alemã Siemens, a francesa Alstom, a japonesa Mitsui e a canadense Bombardier, por fixação de preços relacionados com a construção de redes de trem e metrô no país. Acredita-se que a Siemens divulgou atempada e voluntariamente o cartel às autoridades.
  3. Conexões políticas: O setor da construção no Brasil é conhecido por ter relações acolhedoras com autoridades governamentais. Por exemplo, o Instituto Ethos e a Transparência Internacional realizaram um estudo sobre as eleições de 2010 em que se determinou que 4 dos 6 principais doadores de campanha foram empresas de construção. Uma empresa doou mais de 100 milhões de reais no ciclo (mais de 40 milhões USD – ver Tabela 1 do Relatório do Ethos).
  4. Oportunidades para inflar custos: Como cada projeto de construção é único, os custos de um projeto para outro podem variar muito. Isso torna difícil estabelecer pontos de referência consistentes entre projetos para comparar e acompanhar as despesas. Além disso, certas áreas de trabalho tendem a criar oportunidades para inflar custos. Por exemplo, em “trabalhos de terraplenagem”, os custos relacionados à movimentação e achatamento de bancos de terra diferem amplamente com base em vários fatores técnicos que podem ser de difícil confirmação. Grande parte das melhorias de infraestruturas do Brasil para os eventos atuais envolve a renovação de rodovias, túneis, ciclovias e calçadas, tornando comuns os projetos de terraplanagem. Inflando os custos, as empresas podem chegar a fundos extras com os quais podem pagar propinas.
  5. Contratos modificados: A modificação de contratos de construção com financiamento público é um grande problema no Brasil. Segundo a legislação brasileira, o governo está autorizado a modificar unilateralmente os contratos com base no interesse público. Quando isso acontece, a empresa contratada tem o direito de atualizar preços para manter o “equilíbrio financeiro e econômico”. Isso cria oportunidades para abusos. As empresas podem conseguir adjudicações iniciais com base em estruturas de custos propostas que são controladas e consideradas legítimas, apenas para implementar uma estrutura modificada com componentes questionáveis.
  6. Valores de contrato que escondem montantes para propinas: Os gastos com a Copa do Mundo e as Olimpíadas no Brasil são enormes – o governo já gastou mais de 10 bilhões USD em melhorias apenas para a Copa do Mundo. Um recente artigo do New Yorker lembra que, quanto maior e mais lucrativo for o projeto de construção, mais insignificante pode parecer o custo da propina. Isso significa que o argumento econômico para pagar a propina é mais fácil de fazer quando a propina é relativamente pequena em comparação com o benefício financeiro. Além disso, mesmo que o montante da propina exigida seja significativo, o grande valor do contrato torna o custo da propina mais fácil de esconder na estrutura geral de custos.

A preparação para a Copa do Mundo de 2014 foi marcada por protestos e denúncias de corrupção. E, embora possa parecer prematuro falar sobre as Olimpíadas de 2016 no Brasil, também já houve discussão sobre a corrupção com relação a esses jogos.

As opiniões expressas nesse post são pessoais do(s) autor(es) e não necessariamente são as mesmas de quaisquer outras pessoas, incluindo entidades de que os autores são participantes, seus empregadores, outros colaboradores do blog, FCPAméricas e seus patrocinadores. As informações do blog FCPAméricas têm fins meramente informativos, sendo destinadas à discussão pública. Essas informações não têm a finalidade de proporcionar opinião legal para seus leitores e não criam uma relação cliente-advogado. O blog não tem a finalidade de descrever ou promover a qualidade de serviços jurídicos. FCPAméricas encoraja seus leitores a buscarem advogados qualificados a fim de consultarem sobre questões anticorrupção ou qualquer outra questão jurídica. FCPAméricas autoriza o link, post, distribuição ou referência a esse artigo para qualquer fim lícito, desde que seja dado crédito ao(s) autor(es) e FCPAméricas LLC.

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Matteson Ellis

Post authored by Matteson Ellis, FCPAméricas Founder & Editor

Categories: Brasil, FCPA, Licitação, Português, Transparência Internacional

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